Direito constitucional.
Trata -se, no dizer de José Afonso da Silva, do “Direito Público fundamental por referir -se diretamente à organização e funcionamento do Estado, à articulação dos elementos primários do mesmo e ao estabelecimento das bases da estrutura política”.
A Constituição Federal situa -se no ápice da pirâmide do ordenamento jurídico, de modo que o Direito Constitucional relaciona -se intimamente com os demais ramos do Direito. Tal enlace coloca-se no plano vertical, de maneira que todos os setores do ordenamento jurídico devem retirar seu fundamento de validade, formal e material, da Constituição, servindo esta como fonte primeira e limite insuperável de sua atuação.
A profunda e necessária correlação entre os Direitos Penal e Constitucional merecerá abordagem especial.
Direito internacional público.
Cuida -se do “conjunto de normas consuetudinárias e convencionais que regem as relações, diretas ou indiretas, entre os Estados e organismos internacionais (ONU, UNESCO, OIT, OMS, FAO), que as consideram obrigatórias”.
Posição hierárquica dos tratados e das convenções internacionais sobre direitos humanos.
Os tratados e as convenções internacionais sobre direitos humanos, de acordo com o Texto Constitucional e com a atual orientação do Supremo Tribunal Federal, podem ocupar posição de destaque no âmbito interno.
Quando tais documentos forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais (art. 5º, § 3º, da CF, incluído pela EC n. 45/2004).
Caso sua ratificação interna se dê sem o quórum qualificado acima previsto, situar -se -ão suas normas num plano de supralegalidade, é dizer, acima das leis ordinárias, que àqueles deverão se conformar, embora abaixo da Constituição.
O Estatuto de Roma — Tribunal Penal Internacional.
Previsão constitucional.
“O Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja criação tenha manifestado
adesão” (art. 5º, § 4º, da CF, acrescido pela EC n. 45/2004).
Origem
O Tribunal Penal Internacional foi criado em julho de 1998, na Conferência de Roma, e encontra-se sediado em Haia, nos Países Baixos.
Cuida -se de órgão permanente, ao qual incumbe o julgamento de crimes contra a humanidade, crimes de guerra, de genocídio e de agressão, assim definidos no texto do Estatuto de Roma (promulgado no Brasil por meio do Decreto n. 4.388, de 25.09.2002).
A criação desta Corte Internacional se deu para atender a uma antiga reivindicação, consistente na existência de um tribunal, de caráter permanente, em substituição à prática criticável dos tribunais ex post facto, destinados a julgar crimes de guerra, depois de seu término, pelas nações vencedoras. Foi assim com o Tribunal de Nuremberg, instituído depois da Segunda Grande Guerra para julgar delitos cometidos pelos nazistas. Estes organismos sofriam duras críticas por constituírem, supostamente, a “Justiça dos vencedores”.
A jurisdição deste Tribunal compreende apenas fatos cometidos após sua efetiva instalação, que se deu em 1º de julho de 2002.
Competência supletiva ou complementar (subsidiariedade).
Sua competência é supletiva, pois somente poderá julgar fatos criminosos quando o país em que foi cometido não os tenha investigado ou processado, não pretenda fazê -lo, não reúna as condições necessárias para isso ou não se mostre imparcial e honesta a condução do processo instaurado.
Assim já o reconheceu o Supremo Tribunal Federal: “Estatuto de Roma. Incorporação dessa convenção multilateral ao ordenamento jurídico interno brasileiro (Decreto 4.388/2002). Instituição do Tribunal Penal Internacional. Caráter supraestatal desse organismo judiciário. Incidência do princípio da complementaridade (ou da subsidiariedade) sobre o exercício, pelo Tribunal Penal Internacional, de sua jurisdição”.
Direito processual penal
Segundo Fernando da Costa Tourinho Filho, constitui -se do “conjunto de normas e princípios que regulam a aplicação jurisdicional do Direito Penal objetivo, a sistematização dos órgãos de jurisdição e respectivos auxiliares, bem como da persecução penal”.
Cabe ao direito processual penal ditar as normas segundo as quais o direito penal se exterioriza; este é energia potencial e aquele, o modo pelo qual sua força se concretiza. Não pode haver, num Estado Democrático de Direito, outro meio de se aplicar a pena senão por meio de um processo.
O direito de punir do Estado (ius puniendi), portanto, porta -se como um direito de coação indireta, desprovido de autoexecutoriedade, dependendo, para sua plena satisfação, do devido processo legal — due process of law. Não é outra a conclusão que se retira do art. 5º, inc. LIV, da CF, quando determina que ninguém será privado de sua liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal.
O cometimento de um fato criminoso desencadeia para o Poder Público o dever de punir o agente, tornando realidade a sanção cominada à infração perpetrada. Para tal concretização, porém, o Estado deve necessariamente socorrer -se do Poder Judiciário, mediante um procedimento solene, assegurando -se o contraditório e a ampla defesa, para que, ao final, desde que plenamente demonstrada a culpabilidade do agente, possa o Estado lhe impor uma pena (ou, ainda, uma medida de segurança, quando se tratar de indivíduo perigoso padecedor de déficit mental).
Lembre -se, ainda, de que a Lei Maior autoriza a aplicação imediata de penas alternativas, por meio da transação penal, passível em infrações de pequeno potencial ofensivo, atualmente definidas como as contravenções penais e os crimes cuja pena máxima não exceda dois anos (art. 61 da Lei n. 9.099/95). Nesses casos, dá -se o devido processo legal consensual, em que a consecução da medida pressupõe, além da proposta formulada pelo órgão da acusação, sua aceitação pelo autor do fato, assistido obrigatoriamente por defensor.
Direito civil.
Breve conceito.
Entende -se por Direito Civil, na definição de Maria Helena Diniz, “o ramo do direito privado destinado a reger relações familiares, patrimoniais e obrigacionais que se formam entre indivíduos encarados como tais, ou seja, enquanto membros da sociedade”. Ainda segundo a autora, seus princípios basilares são o da “personalidade, autonomia da vontade, liberdade de estipulação negocial, propriedade individual, intangibilidade familiar, legitimidade da herança e do direito de testar, e solidariedade social”.
Diferenças entre os direitos civil e penal
Há relevantes traços distintivos entre o Direito Civil e o Penal, no campo do ilícito, da sanção e da responsabilidade. De acordo com o Código Civil, entende -se por ilícito: a) o ato de alguém que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, viola direito e causa dano a outrem, ainda que exclusivamente moral (art. 186); b) o exercício abusivo de um direito por seu titular, quando exceder manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes (art. 187).
As sanções preconizadas a estes vão desde a obrigação de reparar o dano, a imposição de multa, a rescisão contratual, a nulidade do ato ou negócio jurídico até, em caráter excepcional, a breve prisão coercitiva, quando se tratar de devedor de alimentos.
O ilícito penal, a seu giro, distingue -se do civil, primeiramente, do ponto de vista ontológico, pois somente se reputará como tal aquele capaz de lesar ou pôr em risco, de modo mais intenso, bens jurídicos considerados fundamentais para a paz e o convívio social. Difere, ainda, no plano formal, pela sua taxativa e cerrada construção, já que só pode haver crime onde existir conduta lesiva a bens jurídicos, descrita como tal em lei anterior.
Suas sanções são aquelas que mais severamente atingem a liberdade individual, notadamente a privação ou restrição da liberdade, a perda de bens, a multa, a prestação social alternativa e a suspensão ou interdição de direitos (art. 5º, inc. XLVI, da CF).
Assim, por exemplo, se o contratante deixar de pagar as prestações devidas, dará causa à rescisão contratual, ficando responsável por ressarcir os prejuízos decorrentes de seu ato, bem como pelo cumprimento de eventual multa estipulada na avença. De igual modo, se a esposa trair o marido, cometendo adultério, poderá o cônjuge requerer a dissolução da sociedade conjugal pelo divórcio. Em nenhum dos casos se imporá ao infrator sanção penal, posto que tais situações, além de não macularem acentuadamente valores fundamentais, não se encontram tipificadas em lei penal alguma.
Diz -se também que a sanção civil visa, primacialmente, reparar o dano, restabelecendo o status quo ante, ao passo que a penal objetiva um fim superior (por exemplo, a retribuição pelo mal cometido, a prevenção, a assecuração de expectativas normativas etc).
Veja, porém, que modernamente alguns dogmas vêm sendo colocados em xeque. Há penas criminais com nítido caráter reparatório, como a prestação pecuniária, pena alternativa cominada no art. 45, § 1º, do CP, pela qual se obriga o réu a pagar uma quantia em dinheiro, preferencialmente à vítima ou a seus dependentes, no valor de um a trezentos e sessenta salários mínimos, deduzindo -se o montante pago na sentença penal de eventual indenização civil.
Existem, sob o prisma da responsabilidade civil, concepções que advogam a tese de que não basta recuperar o estado anterior, devendo se conferir à indenização caráter pedagógico, notadamente no campo dos danos morais. Flávia Portella Püschel e Marta Rodriguez de Assis Machado citam decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça, relativa à inscrição indevida em cadastro de devedores inadimplentes, a qual elevou o montante estipulado para os danos morais, a fim de que a condenação desestimulasse a repetição de semelhantes atos.
Pontos de contato.
Os Direitos Penal e Civil intrincam -se por diversas frentes, entre as quais a da licitude, a da responsabilidade do agente, bem como pela proteção a diversos valores, albergados tanto nas leis civis quanto nas criminais.
No que se refere à licitude, dada a unidade do sistema jurídico, reconhecendo -se permitida determinada conduta à luz de disposição contida em norma civil, ainda que o ato possa corresponder a algum tipo penal, não haverá crime. Isto porque a existência de uma autorização, mesmo prevista fora do campo das normas penais, constituirá um comportamento produtor de riscos permitidos, ou seja, juridicamente aprovados e, portanto, sem qualquer conotação criminosa.
Com referência às responsabilidades penal e civil, embora independentes uma da outra, casos há em que a fixação daquela influencia nesta. Nos termos do art. 935 do CC, o reconhecimento da existência do fato ou de sua autoria, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal, vinculará a decisão cível. Quer dizer que, se o juiz penal, mediante decisão transitada em julgado, definiu, por exemplo, que um furto foi cometido e “A” o praticou, tais questões não poderão ser debatidas na esfera cível. A sentença penal condenatória, bem por isso, torna certa a obrigação de reparar o dano (art. 91, inc. I, do CP), constituindo -se de título executivo judicial (art. 475 -N, inc. II, do CPC).
Frise -se, todavia, que a responsabilidade penal é individual e personalíssima (art. 5º, inc. XLV, da CF), ao passo que o Direito Civil admite a responsabilidade por ato de terceiro, como o caso dos pais que respondem por condutas dos filhos menores, dos tutores em relação aos tutelados, dos curadores em face dos curatelados, do empregador ou comitente por seus empregados, serviçais e prepostos etc. (art. 932 do CC).
De ver, ainda, que uma ampla gama de institutos de Direito Civil, como a propriedade, a posse e a família, encontram especial proteção em determinados setores da legislação penal, como os crimes contra o patrimônio, contra a propriedade imaterial e contra a família (Títulos II, III e VII da Parte Especial do CP). São casos considerados mais graves, em que se reconhece a necessidade da intervenção penal. Desta forma, v.g., se um marido for infiel, cometendo adultério, ficará sujeito a consequências meramente civis, mas, se além de trair o dever de fidelidade conjugal, casar -se com outra mulher na constância do primeiro matrimônio, dar -se -á o crime de bigamia (art. 235 do CP), acarretando a punição na órbita penal.
Direito administrativo.
Celso Antônio Bandeira de Mello define -o como “o ramo do direito público que disciplina a função administrativa, bem como pessoas e órgãos que a exercem”.
O Direito Administrativo possui pontos de contato com o Penal. Pode -se citar, por exemplo, a tutela penal da Administração Pública (Título XI da Parte Especial do CP), os efeitos extrapenais da condenação, dentre os quais há a perda do cargo, função pública ou mandato eletivo (art. 92, I, do CP) e a pena restritiva de direitos, consistente na proibição do exercício de atividade, cargo ou função públicos, bem como de mandato eletivo (art. 47, II, do CP).
Lembre -se, ainda, das leis penais em branco, cujo complemento se localiza em atos administrativos, como o tipo penal definidor do tráfico de drogas (art. 33 da Lei n. 11.343/2006), o qual não cita quais são as substâncias psicoativas capazes de constituir seu objeto material, tendo o legislador transferido esta tarefa (art. 66 da mesma lei) à Administração (vide Portaria SVS/MS n. 344, de 12 de maio de 1998).
Direito tributário.
Segundo Paulo de Barros Carvalho, “É o ramo didaticamente autônomo do direito, integrado pelo conjunto das proposições jurídico -normativas, que correspondam, direta ou indiretamente, à instituição, arrecadação e fiscalização de tributos”.
A finalidade desses ramos do Direito é acentuadamente distinta. O Penal visa proteger valores fundamentais da sociedade e o Tributário, prover economicamente os cofres do Estado, a fim de que este possa concretizar suas finalidades constitucionalmente previstas.
O Direito Tributário conecta -se com o Penal sob vários ângulos, já que ambos pertencem, na tradicional classificação, ao Direito Público e se valem de sanções para punir quem infringe seus preceitos.
O modo mais claro em que se entrelaçam, porém, ocorre por intermédio do chamado Direito Penal Tributário, setor responsável pela incriminação de ilícitos relativos ao inadimplemento de tributos.
Diversos são os chamados delitos tributários, muitos dos quais se encontram definidos na Lei n. 8.137/90, cujo art. 1º contém os mais importantes, pois envolvem a redução ou supressão do valor correspondente ao tributo devido. Nesses casos, aliás, o aperfeiçoamento do crime somente pode ser reconhecido depois do lançamento definitivo do tributo, conforme entendimento consolidado do Supremo Tribunal Federal (Súmula Vinculante n. 24: “Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, incisos I a IV, da Lei n. 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo”).
Muito bom o artigo!