Princípios são proposições básicas, fundamentais, típicas, que condicionam todas as estruturas e institutos subsequentes de uma disciplina. São os alicerces, os fundamentos da ciência, e surgem como parâmetros para a interpretação das demais normas jurídicas.
A seguir serão comentados os principais princípios existentes no regime jurídico administrativo, alguns implícitos e outros expressos, alguns constitucionais e outros legais, todavia, sem o objetivo de esgotar o assunto. Alguns princípios não apontados neste momento serão abordados em outros capítulos da obra, observada a pertinência temática.
O texto constitucional estabelece expressamente, em seu art. 37, caput, alterado pela Emenda Constitucional n. 19/98, cinco princípios mínimos a que a Administração Direta e a Indireta devem obedecer. Para melhor memorização, é possível resumi-los no “LIMPE”, que significa Legalidade, Impessoalidade, Moralidade, Publicidade e Eficiência. Além desses, a Administração também é orientada por inúmeros outros princípios espalhados pelo texto constitucional.
Ressalte-se ainda que muitos princípios que serão abordados no decorrer deste capítulo estão previstos de forma expressa no ordenamento jurídico infraconstitucional, especialmente na Lei n. 9.784, de 29.01.1999, que define o processo administrativo. O seu art. 2º enumera os seguintes princípios: legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência. Esse diploma representa um marco para o Direito Administrativo, por ter resolvido várias divergências presentes na doutrina.
Segundo Celso Antônio Bandeira de Mello, a caracterização do Direito Administrativo e a base de seu regime jurídico se delineiam em função da consagração de dois princípios, por ele denominados pedras de toque ou supra princípios: o princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse particular e o princípio da indisponibilidade do interesse público, dos quais se extraem inúmeros princípios, dentre eles o princípio da legalidade, que também tem como implicações os princípios da finalidade, da razoabilidade, da proporcionalidade, da motivação e da responsabilidade do Estado, além de outros. Seguindo esse pensamento, passa-se ao estudo individualizado dos princípios.
Princípio da supremacia do interesse público
O princípio da supremacia determina privilégios jurídicos e um patamar de superioridade do interesse público sobre o particular. Em razão desse interesse público, a Administração terá posição privilegiada em face dos administrados, além de prerrogativas e obrigações que não são extensíveis aos particulares.
A supremacia é considerada um princípio geral do direito, inerente a qualquer sociedade, como condição de sua existência e como pressuposto lógico do convívio social. Esse princípio não está escrito, de forma expressa, no texto da Constituição, embora se encontrem inúmeras regras constitucionais que a ele aludem ou impliquem manifestações concretas dessa superioridade do interesse público. Empregando essa ideia, o constituinte introduziu alguns dispositivos que permitem ao Estado adquirir a propriedade do particular, independentemente da sua vontade, tendo como fundamento uma razão de interesse público, instituto esse denominado desapropriação (uma forma de aquisição originária da propriedade).
Nesse sentido, o art. 5º, inciso XXIV, define a desapropriação comum ou ordinária, que se justifica por necessidade, utilidade pública e interesse social, garantindo a indenização prévia, justa e em dinheiro. Sobre o assunto, há também os arts. 182, 184 e 191, que dispõem sobre a desapropriação em razão do desrespeito à função social da propriedade protegida pela Constituição Federal, que surge como uma forma de sanção, classificada como extraordinária.
Podem-se apontar, ainda, regras sobre requisição de bens do particular quando estiver presente um iminente perigo como é o caso do art. 5º, inciso XXV, da CF, além de disposições de proteção ao meio ambiente, relações de consumo, entre outras.
A superioridade do interesse público em face do interesse privado encontra-se ainda nos demais institutos de intervenção na propriedade, além da desapropriação e da requisição, como é o caso da servidão administrativa, da limitação administrativa e do tombamento.
Esse princípio também pode ser identificado em quase todos os institutos do Direito Administrativo, iniciando com as prerrogativas do regime público de algumas pessoas jurídicas, como é o caso das autarquias que apresentam privilégios tributários e processuais, proteção especial quanto aos seus bens e o regime de precatório para pagamento de seus débitos judiciais, além de outros.
Para os atos administrativos, é possível verificar essa supremacia em seus atributos, considerando que eles gozam de presunção de legitimidade, de autoexecutoriedade e de imperatividade, sendo, respectivamente, morais, legais e verdadeiros até que se prove o contrário, podendo ser praticados independentemente da autorização do Poder Judiciário e impostos coercitivamente à coletividade.
Alerte-se ainda que a Administração tem também a possibilidade de revê-los quando necessário. Também se verifica a supremacia quando do estudo dos contratos administrativos e de suas peculiares cláusulas exorbitantes, que permitem à Administração modificar ou rescindir unilateralmente um contrato, bem como a possibilidade de fiscalização da sua execução, a aplicação de penalidades ao contratado e a ocupação provisória de seus bens (regra prevista no art. 58 da Lei n. 8.666/93).
Nesse contexto, é importante grifar que a utilização desse princípio só será legítima quando aplicada como instrumento para o alcance de interesses coletivos, não se admitindo a sua utilização para satisfazer apenas interesses ou conveniências apenas do aparelho estatal e, muito menos, dos agentes governamentais.